Como se planejar > Cuidados com a saúde

Assim como são vários os Caminhos, também o são os peregrinos, que se diferenciam pelas nacionalidades e idades, e que trazem consigo algumas patologias e comorbidades, que podem ocasionar transtornos capazes de causar a interrupção da viagem, o que seria muito frustrante, depois de um longo processo de preparação que, às vezes, leva muitos meses. 

A ideia é trazer orientações básicas que, por serem simples, são esquecidas.

Como qualquer atleta que se prepara para uma disputa esportiva, fazer um dos Caminhos à Santiago de Compostela, independentemente da idade, significa andar centenas de quilômetros com distâncias diárias a serem percorridas, em um período de tempo que nem sempre seria o ritmo ideal para você e isso irá exigir sempre uma preparação logística, física e uma visita ao seu médico assistente (MA).

Lembro que doença não vê idade e quem melhor conhece você é você mesmo ou, para aqueles que têm acompanhamento médico, o seu MA. 

A sua viagem começa em um voo longo, existindo a possibilidade de trombose em membros inferiores para os mais idosos e/ou com alguma comorbidade; por isso é importante caminhar no corredor do avião, assim como fazer uma boa hidratação e exercícios forçando as panturrilhas.

É aconselhável que pessoas com mais de 60 anos, os que têm vida sedentária e os que possuem doenças crônicas se submetam a um check-up e exponham seus planos ao seu MA, que solicitará exames específicos, aconselhará sobre a conveniência ou não de fazer o Caminho e poderá sinalizar sobre a necessidade de um preparador físico, além de aconselhar o candidato a peregrino a fazer um percurso menor ou alterná-lo com outros meios de transporte.

E quais seriam essas doenças tão impeditivas ou que demandariam maiores cuidados, atenção e preparação física?

Seriam, principalmente, as patologias cardíacas, pulmonares, vasculares, hipertensivas, hematológicas, reumáticas, diabetes e alérgicas. 

Vamos, então, às orientações médicas.

Levar sempre um relatório do MA, de preferência com cópia em inglês, em que deve constar as patologias, as comorbidades, as cirurgias, bem como os remédios de uso contínuo, com a respectiva dosagem diária e total.

Esse relatório poderá adotar o seguinte modelo:

“Atesto ou declaro que a pedido o Sr.(a) xxxxxxxxx, que abre mão do seu sigilo médico, conforme assinatura neste mesmo receituário, para fins de comprovação junto a qualquer autoridade competente bem como na necessidade de atendimento médico de urgência o relato do seu quadro clínico e dos medicamentos atualmente em uso bem com a sua quantidade que poderá a vir a fazer uso durante o seu período de viagem.”

Todos os demais remédios devem ter receitas com datas próximas ao dia da viagem.

O ideal é que uma das caixas seja preservada e as demais descartadas, em função de volume e peso.

Medicação controlada (derivados morfínicos, benzodiazepínicos e xaropes antitussígenos) deve ter relatório à parte com indicação precisa do uso. Exemplo: dor crônica, insônia, claustrofobia etc.

A necessidade dos relatórios se faz diante do aumento do tráfico de drogas em viagens internacionais, tanto aéreas como terrestres, evitando dissabores na alfândega e ou em uma revista durante a viagem.

Os peregrinos alérgicos devem ter, de preferência no bolso, um cartão plastificado relatando, em destaque, os medicamentos que não podem ser usados.

Ter sempre os contatos do seu MA e de uma pessoa da sua família ou amiga, para qualquer emergência, junto com o seu roteiro de viagem, que inclua seus albergues, hotéis etc., com datas prováveis de estadia/passagem, telefones e e-mails.

Lembrar também da importância e obrigatoriedade do seguro viagem segundo as exigências do Tratado de Schengen.

Orientações físicas

Você programou o seu roteiro, fez ou está fazendo o seu preparo físico, além das caminhadas. Porém é bom lembrar que apesar de estar andando na melhor das hipóteses todo dia e eventualmente fazendo também caminhadas com subidas você ainda está em casa. Isto significa que ao voltar você vai para o conforto do lar, tomar o seu banho, descansar o tempo que quiser fazer uma refeição gostosa e saudável obedecendo a sua dieta que pode ser médica ou não, se sentir seguro e sem estresse.

Vamos agora à realidade da viagem.

Importante: você não deve começar a caminhar logo após o seu voo.

Você está em outro país, com uma diferença de fuso horário que, por si só, traz alterações para seu organismo, principalmente na parte física.

Então, começa a sua jornada e, após várias horas de caminhada, você chegará ao seu destino, provavelmente cansado, e irá descobrir se a sua escolha do albergue foi acertada e provavelmente irá compartilhar com outros peregrinos vários espaços e uma primeira noite que poderá ser ótima ou ruim.

Você verá que isto não foi treinado ou vivenciado para aqueles de primeira vez, mas que, com certeza, será esquecido quando alcançar o seu destino: a Catedral de Santiago.

Bom Caminho!

Mauro Jatobá de Araujo
Peregrino e Anestesiologista
CRM 52.28429-0

 

Preparação Física

Caminhe não só no plano. Suba e desça morro ou escada, de preferência com a mochila, para se acostumar ao peso.

É indicado pedir conselhos ao seu médico ou a um outro profissional da área, como educador físico ou fisioterapeuta.

Medicamentos

Leve seus remédios de uso diário e contínuo com sobra para mais uns dias além do previsto. 

Pode ser necessária a apresentação de receita médica para a compra de remédios. Por isto, se você necessita utilizar constantemente algum medicamento (doenças pré-existentes), leve-o consigo do Brasil. Exemplos comuns são os remédios para diabetes, hipertensão, problemas do coração, hipotireoidismo, epilepsia, enxaqueca e outros.

Se você usa remédios de uso controlado, leve a receita, de preferência, com tradução em espanhol e inglês, para comprovar que os medicamentos são seus e não para tráfico de entorpecentes.

Os medicamentos de uso mais comum, como os cremes antiinflamatórios, antitérmicos, analgésicos, para insônia, diarréia, prisão de ventre etc, podem ser adquiridos sem problemas e são facilmente encontrados.

 

Há que se observar o horário em que as farmácias estão abertas. Na parte da tarde, muitas delas, principalmente nas pequenas localidades, só abrem após às 16 ou 17 horas. Esta é a hora que termina a tradicional “siesta” dos espanhóis.

É interessante, antes de viajar, jogar fora as embalagens dos medicamentos (mas não necessariamente as bulas) e acondicioná-los em sacos plásticos ou pequenos recipientes de plástico para protegê-los da umidade.

Os antiinflamatórios merecem um comentário adicional:

Existem antiinflamatórios que vêm associados a analgésicos que atuam por até 24 horas. Seu uso indiscriminado ou sem orientação médica tenderá, com a eliminação dos sintomas, a mascarar um quadro que poderá, em pouco tempo, se tornar muito mais grave.

Se for fazer uso de um desses medicamentos, faça-o por somente uma vez (para aliviar o desconforto da dor) e espere de 24 a 36 horas. Persistindo os sintomas, procure ajuda médica imediatamente.

De modo geral, não use medicamentos sem conhecimento de um médico. Você estará muito longe de casa para arriscar, não é?

Alimentação

A alimentação é um fator de grande importância, pois dela dependerá seu estado físico e seu ânimo. Portanto, é conveniente sair do albergue pela manhã alimentado e levar alguma coisa leve e nutritiva na mochila. Geralmente só há bares ou mercados abertos após às 9h. Então você deverá providenciar na véspera o seu desjejum. Quando chegar ao albergue em que for pernoitar, procure logo saber se tem cozinha e utensílios para preparar uma refeição. Depois compre o que for adequado. A grande maioria das tiendas das pequenas localidades só abre após às 16 ou 17 horas.

Se você come de tudo, será muito fácil comer nos restaurantes sem gastar muito. Os restaurantes têm um menu comercial composto de 1° prato, com 3 ou 4 opções, e o 2° prato, também com 3 ou 4 opções, mais sobremesa e vinho ou água, por cerca de 10 a 15 Euros. Se você não come carne, também poderá usar o menu, embora com menos opções. Entretanto, uma refeição feita por você, na cozinha do albergue, à noite, pode sair bem mais em conta que comer o Menu do Peregrino no restaurante – cerca de 70% mais barata. Não coma coisas que você desconfie que possam lhe causar má digestão ou desarranjo intestinal, pois isso será um transtorno bem desagradável.

Nem todos os albergues possuem cozinha e alguns que possuem esta facilidade podem não ter pratos, talheres e panelas para você cozinhar.

Pergunte ao hospitaleiro se há bares ou mercados nos pueblos ao longo do seu percurso do dia seguinte, para saber se encontrará comida neles e prevenir-se. Tenha em mente que em alguns trechos do Caminho você atravessará vários pueblos seguidos, onde não haverá nenhum comércio.

Dependendo da hora que você sair do albergue, pode não haver nada aberto onde você possa comprar alimentos ou tomar seu desjejum. Por isto, é aconselhável se prevenir e comprar alguma comida, antecipadamente, para o dia seguinte.

No almoço, evite a alimentação em quantidade e prefira comidas leves. O reinício da caminhada após esta refeição será muito difícil, se você não seguir este conselho – principalmente se estiver peregrinando num período quente do ano. Ao longo do Caminho você terá a oportunidade de “tomar emprestadas” algumas frutas, como maçãs, uvas, peras etc. Além disso, é interessante que você tenha sempre à mão uma pequena quantidade de alimentos ditos energéticos, como as frutas secas (ameixas, figos, passas etc.) e barras de cereais. Quem gosta de amendoim, sementes de girassol e assemelhados poderá encontrá-los com facilidade em qualquer tienda ou supermercado.

É bom lembrar que o comércio e os restaurantes costumam fechar no meio do dia, para a siesta, principalmente na Espanha, durante umas três horas ou até mais. Cuide para não chegar ao seu destino cheio de fome, bem na hora da siesta, e não ter um suprimento na mochila.

Para o jantar, os alimentos “mais votados” para consumo no albergue são: macarrão, pão, linguiça, todos os prensados, feijão branco (em lata), arroz, lentilhas e saladas em geral. Atum, os queijos e os iogurtes também estão entre os preferidos. O vinho, segundo a maioria, não pode faltar – principalmente se você já está na área da Rioja.

Hidratação

Beba água! 

Hidratar-se é tão importante quanto a alimentar-se. 

A água das torneiras e das fontes é potável, salvo quando sinalizado em contrário.

Antes de encher sua garrafinha, jogue fora o que ainda tiver de sobra. 

Se você é adepto de bebidas isotônicas, cuidado com o excesso. Água é sempre melhor.

Bolhas

Se sentir qualquer ardido nos pés, pare e proteja a área com micropore.

Muitas pessoas passam vaselina ou cremes próprios para os pés, para diminuir o atrito das meias com os pés.

Se realmente surgir alguma bolha, o mais importante é nunca cortar a pele, pois pode inflamar ou mesmo infeccionar.

Peça ajuda ao hospitaleiro, que poderá lhe ensinar a tratar ou direcionar a alguém que o faça.